ADUFPEL - Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas

Logo e Menu de Navegação

Andes Sindicato Nacional
A- A+

Notícia

Entrevista: professor Gonzalo Rojas (UFCG) fala sobre conjuntura e ataques à educação pública

O professor doutor Gonzalo Adrián Rojas, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), esteve em Pelotas no dia 30 de outubro para abordar o centenário da Reforma Universitária de Córdoba. Anteriormente, concedeu entrevista à ADUFPel-SSind sobre conjuntura e consequências das medidas adotadas pelo governo federal nos últimos anos que colocam em risco o ensino público e interferem na autonomia universitária e sindical. Confira a entrevista na íntegra:


O candidato eleito afirmou que pretende alterar a forma como ocorre o processo de eleição para a reitoria das universidades públicas. Caso ocorra mudança e o reitor passe a não ser mais empossado a partir da escolha da comunidade acadêmica, quais serão as suas consequências e qual a importância da participação da comunidade na tomada de decisões na universidade?

Primeira questão, a eleição teve como resultado o triunfo da extrema-direita com seus métodos e significa uma mudança no regime político. Essa mudança no regime político se dará através de algumas questões. Alguma delas poderia ser essa proposta citada, mas apresenta de forma muito autoritária qual é o projeto político deles. Acho que a luta tem que ser claramente em defesa da autonomia universitária e a partir desta defesa da autonomia universitária será a luta dentro das universidades, da comunidade universitária, mas também fora, vinculada à classe trabalhadora, aqueles que poderão barrar o conjunto de reformas que tem proposto o Bolsonaro contra o conjunto da classe trabalhadora e nós, como professores, e comunidade universitária. A luta é por uma maior democratização das universidades que ainda não são tão democráticas. Querem acabar com o pouco de democracia que existe nelas.


Alguns órgãos e organizações financeiras defendem a cobrança de mensalidade nas universidades públicas. Como analisas essa visão mercantil da educação?

Não é um debate novo, é um debate que foi colocado no Chile, na ditadura de Pinochet, e por Carlos Menem, na Argentina, na década de 90.  Eu fazia parte do movimento estudantil e conseguimos barrar isso. É uma proposta política de elitizar ainda mais as universidades, mas em um país como o Brasil, com essa enorme desigualdade social, seria uma verdadeira catástrofe. Mas independentemente desta questão, a luta tem que ser claramente em defesa da universidade pública, gratuita e socialmente referenciada, do ponto de vista de estar vinculada à classe trabalhadora. A luta tem que ser especificamente nesse sentido.

Nos últimos anos, as redes de ensino privadas brasileiras, como a Kroton, lucraram fortunas às custas do governo federal. Como analisas o financiamento, por parte do governo, do ensino privado? De que forma isso afeta a dinâmica de funcionamento das universidades?

Particularmente, defendo que a educação tem que ser pública 100%. Nesse sentido, não é casual que frente às tentativas truculentas ao conjunto da educação, os grandes empresários que lucram com a educação se colocaram todos à disposição do novo governo para tentar apresentar projetos que logicamente continuam beneficiando a eles. Desse ponto de vista, acho que a defesa da educação pública e gratuita encontra esses grandes conglomerados que não estão preocupados com o conteúdo, mas fundamentalmente com o lucro. Logicamente, a luta deveria ser pela expropriação, mas isso depende das condições da luta de classes.

O programa Escola Sem Partido reflete a atual conjuntura? Quais seus impactos sobre a universidade?

Nas universidades tem uma parte dos professores que se manifestam de forma crítica, e o Escola Sem Partido não é outra coisa senão uma ideologia que pretende controlar ideologicamente aqueles que pensam diferente. Acho que nós professores não temos que ficar na defensiva, temos que nos manter ministrando as aulas do ponto de vista acadêmico, científico, teórico e político, como a gente faz sempre. Não existe neutralidade na ciência. Quem fala que existe neutralidade na ciência, na realidade está ocultando qual é a sua verdadeira ideologia. Para nós, é importante defender a autonomia que tem que ter o professor para poder ministrar o conteúdo e sua disciplina sem nenhum tipo de patrulhamento. Você tem agora a deputada do partido do Bolsonaro que está insistindo que assediem os professores, mas a resposta tem que ser clara e contundente. A resposta é coletiva e não individual.

O que significa o estímulo à expansão dos cursos EAD nas universidades públicas?

Foi uma parte do próprio projeto neoliberal de degradar a educação superior da melhor forma possível. Isso seria um aprofundamento de algumas coisas que também já estão acontecendo. São coisas que vêm acontecendo e na proposta política de Bolsonaro aparecem com muita força. É uma proposta profundamente neoliberal, é uma ultradireita que não é nacionalista. Em um país semicolonial como Brasil, a ultradireita é ultra neoliberal. Então, a tragédia social que triunfa é uma eleição manipulada como nunca na história moderna do Brasil. Há um papel do Judiciário muito importante nessas manobras políticas e o Exército na retaguarda para garantir o que o Bolsonaro coloca. São 22% de evangélicos que influenciaram em termos eleitorais no plano local, mas nunca haviam tido influência coletiva tão forte no plano nacional. Então, acho que esse é o quadro, mas, mesmo nesse quadro, eu entendo que vai ter luta. Não tem como não ter.

Como aconteceu a ação policial na ADUFCG e como tu avalias o ocorrido?

Acho que foi uma questão clara que expressou do pior jeito o que estava apresentado nacionalmente. Depois a gente descobriu que havia sido uma ação coordenada em diferentes universidades no mesmo dia. Na ADUFCG foi muito mais grave porque envolveu a polícia e a ordem judicial era absolutamente absurda. A polícia se excedeu para além da ordem judicial, como acontece sempre. Fundamentalmente, tentaram desorganizar aqueles que estavam lutando contra a candidatura de Bolsonaro. Isso eu posso falar tranquilamente porque a posição da assembleia da ADUFCG foi voto crítico em Haddad, de forma absolutamente independente do PT.


De que forma situações como essa afetam a democracia e a autonomia?

A facilidade com que essas ordens judiciais – tanto em Campina Grande quanto em outras cidades – entraram na universidade é um problema político e tem relação com a autonomia. Parece que não existe autonomia na universidade. É um fato político que apresenta com muita clareza um avanço contra as liberdades democráticas. A ADUFCG é um sindicato independente do Estado, dos governos e da própria instituição universitária. É um sindicato de trabalhadores, autônomo e classista.

Como analisas esta conjuntura?

Existiu o triunfo eleitoral do Bolsonaro e esse triunfo eleitoral se acelerou muitíssimo na última semana, mesmo que a diferença tenha sido muito menor do que inicialmente se poderia esperar, tendo em vista o primeiro turno. Houve uma clara desaceleração da candidatura de Bolsonaro na última semana, produto dessas declarações anti-esquerda, anti-ativismo, essas declarações abertamente fascistas e os avanços autoritários. O Bolsonaro expressa um processo de autoritarização do regime, onde o Judiciário tem um papel muito importante e as forças armadas também. Isso é produto de eleições profundamente manipuladas.

O Bolsonaro implica na tentativa de fechar a crise orgânica que existe no Brasil em termos de ultradireita, tentando atacar os trabalhadores de forma mais brutal ainda do que foi o governo Temer. É produto das próprias contradições que vai ter o próprio governo Bolsonaro com grande parte da sua base, tendo que compactuar com um sistema político muito criticado pelo conjunto da sociedade que aparecia por fora. A partir daí, se abre um espaço de luta de classes onde a gente tem que intervir com muita força. A tarefa hoje é fazer o que está sendo feito em todo o Brasil, que é construir comitês de base contra Bolsonaro. Mas tem que ser contra Bolsonaro, contra golpistas e contra reformas, porque está claro que a política de conciliação de classes do PT e uma política meramente eleitoral são absolutamente insuficientes para derrotar alguém como Bolsonaro e a extrema-direita.

Os próximos anos serão difíceis?

Eu confio que vai ter luta de classes e acho que, a partir disso, a gente pode pensar em sair da defensiva e pensar em uma estratégia que permita superar. Os ciclos políticos são muito mais curtos. Isto está claro. O ciclo político de Temer terminou antes do fim do seu mandato, quando não conseguiu aprovar a Reforma da Previdência, e que a gente não derrotou nem mandou Temer embora porque a CUT e a CTB preferiram canalizar tudo confiando nas eleições, no lugar de dar continuidade à luta. Se os sindicatos convocarem assembleias de base para formar comitês contra Bolsonaro, acho que isso pode massificar a luta. É possível derrotar Bolsonaro, mas para derrotá-lo é preciso também que a classe trabalhadora entre em cena. Se a classe trabalhadora entrar em cena, os setores sociais oprimidos e a juventude também, há uma boa possibilidade de lutar contra ele e superar também esse regime político que tão pouco nos beneficia.


Assessoria ADUFPel

Foto: Assessoria ADUFPel


Veja Também

  • relacionada

    Assembleia Geral Extraordinária aprova regimento para consulta à comunidade da UFPel

  • relacionada

    Em Assembleia Conjunta, servidores/as da UFPel reiteram a importância da greve

  • relacionada

    Dia Nacional da Libras é comemorado nesta quarta (24)

  • relacionada

    ADUFPel e ASUFPel convidam estudantes pra conversar sobre a greve

  • relacionada

    Nota Política Assembleia Geral de Greve

  • relacionada

    Assembleia de Greve rejeita proposta do governo

Newsletter

Deixe seu e-mail e receba novidades.