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Pandemia agrava índices de insegurança alimentar

Matéria publicada no jornalVOZ DOCENTE, março/2022


Se a pestilência insiste em cercar nossos lares, nestes tempos pandêmicos um outro mal - nunca verdadeiramente erradicado - tornou a bater na porta dos brasileiros: a fome. Segundo dados de um inquérito nacional realizado em dezembro de 2020, cerca de 55% dos brasileiros conviviam com algum nível de insegurança alimentar durante o primeiro ano da pandemia. No nível grave, são 9%. 


Talvez a porcentagem seja insuficiente para dar a dimensão do problema, mas são 19 milhões de brasileiros em estado de fome e outros 43 milhões convivendo diariamente com a incerteza de que haverá algo para colocar na mesa. Não é sem motivo que, de lá para cá, a situação só degringolou. 


O desemprego galopante, aliado aos altos índices de inflação mudou o prato do brasileiro ao ponto de que o que antes era refugo para os bichos hoje se torna comida de gente. Na mídia, ao longo de todo 2021, encontramos matérias sobre os abusos na cobrança do quilo do osso de descarte. No Distrito Federal a situação foi tamanha que o Procon precisou agir, alegando princípio de dignidade. Os ossos deveriam ser doados, não vendidos.


Escala

O inquérito acima mencionado, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, segue uma metodologia já estabelecida: a  Escala Brasileira de Insegurança Alimentar – EBIA. Nela, os sujeitos são investigados tendo em vista sempre a experiência de fome nos últimos três meses.


Os valores são  pontuados a partir de uma espécie de questionário: nos últimos meses, você já se preocupou que os alimentos  acabassem antes de poder comprar ou receber mais comida? Deixou de fazer alguma refeição por falta de dinheiro?   Preteriu alimentos saudáveis por falta de verba?  São todos indicativos que ajudam a dar forma  ao panorama estudado.


Ao utilizarem a escala, os pesquisadores puderam recorrer aos mesmos indicadores levantados em estudos anteriores - fornecendo a dimensão mais precisa do problema em que estamos envolvidos. 


As observações são preocupantes: se a insegurança alimentar  regrediu amplamente até 2013, os números coletados mais de quinze anos depois mostram uma regressão aos mesmos patamares de 2004, quando as medições com o indicativo começaram.


Pelotas

Na cidade de Pelotas, também houve iniciativas para compreender os níveis de insegurança alimentar entre os moradores. Exemplo disso foi a pesquisa realizada em 2008, pela professora da UFPel Janaína dos Santos Mota, docente do Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia. Em sua dissertação de mestrado, Janaína inquiriu cerca de 1500 domicílios. Neles, a prevalência da insegurança alimentar entre as famílias foi de 11%, sendo que 3% em estágio de fome.


Anos depois a mestranda da UFPel Eloísa Porciúncula buscaria comparar as descobertas em 2019. O estudo pretendia elaborar um retrato da situação de toda a cidade, e ela já havia entrevistado mais de 400 domicílios quando a pandemia veio e mudou tudo.


Para continuar a investigação diante do cenário pandêmico, em que o distanciamento social se tornou uma preocupação urgente, Eloísa recorreu a chamadas por telefone e whatsapp. Por certo que a adesão não foi a mesma, o que gerou distorção nos dados. Ainda assim, para todas as famílias em que foi possível esse contato via telefone, em cinco de cada 100 domicílios houve relato de fome durante a pandemia. 


Segundo a pesquisadora, há características comuns entre as famílias vivendo em insegurança alimentar e, portanto, esses grupos não podem ser negligenciados pelos gestores públicos e podem, inclusive, ser o ponto de partida para a construção de políticas visando a redução desta situação na cidade. 


Por meio do comparativo de dados, foi possível para Eloísa perceber quem é essa pessoa em insegurança. Os números eram mais graves nos casos em que a chefe da família era mulher, negra ou parda, com menos de 4 anos de estudo. Outro detalhe que não deixa de chamar atenção: 44% das pessoas em situação de insegurança alimentar eram obesas.


A explicação se desdobra em um entendimento mais complexo do tema. Fome é o aspecto mais grave da insegurança alimentar, por certo, mas os estágios anteriores também dizem respeito à qualidade da dieta. Em entrevista ao podcast Viração, da ADUFPel,  Janaína dos Santos Mota ajuda a compreender este dado. 


"Quando a pessoa não tem dinheiro para realizar as refeições adequadas, muitas vezes acaba preferindo comprar alimentos ultraprocessados que são mais baratos, estragam menos e com maior aporte calórico - na ilusão de que aquilo lhe traga mais saciedade", elucida. Nessa mudança da dieta que o índice de pessoas obesas se prova mais elevado.


Entraves

Logo no início da pandemia, Janaína Mota aprovou um projeto junto à Fapergs, a Fundação de Amparo à pesquisa do Estado, para tratar de inspirada em um projeto chamado Vigitel, que se propõe a fazer a vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas. O "tel", do nome, se deve a metodologia: há uma década que o estudo é feito por inquérito telefônico.


A partir do mesmo fundamento surgiu a Covidtel Gaúcho, uma pesquisa em várias etapas que buscava averiguar medidas de proteção individual, prevalência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (fatores de risco para complicações por Covid-19), estilo de vida e, claro, insegurança alimentar.  No entanto, o trabalho não correu como o esperado.


"Nós não contávamos que os principais golpes durante a pandemia eram justamente feitos por telefone e whatsapp", recorda Janaína. A população não apenas se mostrava receosa de responder aos entrevistadores, como também passaram a denunciar massivamente as contas  de telefone criadas para esta finalidade. A expectativa era fazer 1900 entrevistas e foram feitas apenas 741. 


O trabalho, como não podia deixar de ser, continua.


Fonte: Assessoria ADUFPel

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