A juventude quer voar: ato em Pelotas debate a redução da maioridade penal
Na manhã de hoje, em Pelotas, ocorreu
um ato e uma aula pública contrários à redução da maioridade penal. O evento
foi chamado pelos coletivos de juventude Germinal, RUA, União da Juventude
Socialista (UJS), Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, União da
Juventude Comunista (UJC), Núcleo de Advocacia Popular (NAP), Pastoral da
Juventude, Juntos e Levante Popular da Juventude e concentrou-se em volta ao
chafariz do calçadão. Representantes das entidades expuseram suas falas e
chamaram a população para debater a questão da redução que, expressa na Proposta
de Emenda Constitucional (PEC) 171/93, será votada hoje na Câmara de Deputados.
Houve também panfletagem no calçadão.
A Proposta
Em 1993, o então ex-deputado Benedito
Domingues (PP-DF) apresentou uma PEC em favor da redução da maioridade penal de
18 para 16 anos. A PEC 171/93 vem sendo discutida desde então e nesse ano
entrou na pauta de votação da Câmara Federal dos Deputados. Com o crescimento
do conservadorismo na Câmara, o deputado Eduardo Cunha (PMDB) retoma
determinadas discussões com a certeza de que elas vão ser votadas
favoravelmente ao que seu partido defende. Ainda que 87% da população brasileira
seja favorável, de acordo com pesquisa realizada pelo Datafolha em junho, órgãos que lidam diretamente com a segurança e com a juventude
apresentam argumentos contrários à PEC da redução. A Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB) a considera inconstitucional e já antecipou que, caso ela passe
pela Câmara, irá entrar com um processo no Supremo Tribunal Federal (SPF).
Contra
ou a favor?
O fato que leva a grande parte da
população ser favorável à redução tem ligação ao apelo sensacionalista e
simplista dos grandes meios de comunicação. Nenhum veículo televisivo traz a
contextualização necessária sobre o tema e nem mesmo estatísticas sobre o
crescimento das prisões privadas de empresários que financiam campanhas dos
deputados favoráveis são mostradas. Também se calam sobre a alta taxa de
reincidência das prisões e, por consequência, sobre a nulidade da
ressocialização e da reeducação dos presos. Assistimos um crescimento de
programas onde a violência é transmitida ao vivo mas, por outro lado, temos
poucas opções quando se trata de notícia contextualizada e comprometida
socialmente.
Julio
Domingues, militante do Psol, durante o evento, abordou essa questão,
reafirmando que a grande mídia não complexifica o debate da redução e utiliza
um espaço excessivo da programação para noticiar a violência, mas não para a discutir.
Além disso, é pouco comum ouvir dados sobre a atuação das instituições
socioeducativas, como o Centro de Atendimento Sócio-Educativo (Case) e a Fundação
de Atendimento Sócio-Educativo (Fase), que hoje são responsáveis pelo
cumprimento da pena do menor infrator. “Por mais dificuldades que essas
instituições tenham, existe um dado que nunca aparece nos meios de comunicação,
que é o fato de que nessas casas há um número muito menor de reincidência. Os
jovens que adentram nelas têm menor chance de cometer crimes novamente do que
os que vão ao presídio”, diz.
Algumas pessoas paravam e escutavam as
falas, posicionando-se ou apenas assistindo a discussão. Para Walnei
Oliveira, funcionário de restaurante, a redução parece ser a solução. Ele afirma: “Não tem serviço e
emprego em Pelotas, então os jovens ficam aí nas drogas, roubando, nas ruas.
Eles têm que pagar o pato lá na prisão. Eu não sei se a prisão educa ou não,
nunca estive preso para saber. Não vejo outra solução, sou a favor, mas a gente
está aqui escutando para ver as opiniões”.
Já a professora de teatro Mauren
Nogueira, discorda. “Estou aqui como cidadã e educadora contra a redução da
maioridade penal, pois acredito que não é encarcerando a juventude negra e
pobre, que é a grande maioria dentro dos centros socioeducativos, que se
resolve o problema. Em vez de reduzir a maioridade e encarcerar cada vez mais
cedo nossos jovens, a gente precisa investir mais em educação e melhorar os
espaços que já existem, como o Case, para que eles sejam de fato
socioeducativos”.
Contrários ou favoráveis, o
interessante foi presenciar o espaço de diálogo, fundamental para a construção
de um mínimo entendimento sobre uma questão que afeta tanto a vida da juventude
e da sociedade brasileira.
A
redução da maioridade funciona?
Não existem taxas que comprovem a
diminuição da violência por consequência da redução da idade penal. Dos 54
países que diminuíram a idade adulta de punição, nenhum diminuiu a violência e
desses, Alemanha e Espanha retornaram à idade penal de 18 anos. No país
inteiro, movimentos sociais, de juventude e artistas estão organizados em
campanhas que dialoguem com a população e apresente uma perspectiva de apela
para mais políticas públicas, mais escolas e menos punições à juventude.
É preciso também atentar para o fato de
que existe uma violência praticada pelo Estado que, em grande parte dos casos,
tem incidência sobre o crime que o jovem comete: é a negação do acesso à
moradia, educação, alimentação, entre outros direitos constitucionais. Winnie
Bueno, representante do coletivo Juntos, menciona outro tipo de delito estatal,
este praticado após o ato infracional, dentro dos espaços em que deveria
ocorrer a ressocialização: “os nossos
preceitos constitucionais dizem que torturar e submeter as pessoas a condições
degradantes são crimes hediondos. O Estado tem cometido esses crimes hediondos
todos os dias, colocando as pessoas em situações extremamente degradantes
dentro dos presídios”.
Em Pelotas, o ato realizado na manhã de
hoje apresentou um importante debate sobre o tema. Somente com uma discussão
coletiva é possível chegar a um mínimo entendimento sobre a maioridade penal.
Frente a um cenário onde o conservadorismo ganha força, a união daqueles que
sonham com uma transformação social é fundamental.
Confira mais fotos do ato aqui.
Assessoria ADUFPel
Foto: Assessoria ADUFPel