Cortes ameaçam o financiamento de pesquisas no país
Pesquisadores financiados pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) podem ficar sem bolsas a partir
de outubro. A informação foi dada pelo presidente da instituição, João Azevedo,
ao Jornal da USP e confirmada pela assessoria do próprio órgão. O CNPq é ligado
ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
Com um rombo de R$ 300 milhões no orçamento, os R$ 912
milhões previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) não serão suficientes para honrar
os compromissos da instituição. O mínimo necessário seria R$ 1,2 bilhão,
segundo Azevedo.
Outro ponto delicado diz respeito à estrutura operacional
do próprio CNPq. Ela estaria defasada do ponto de vista tecnológico e operando
no limite da sua capacidade. O quadro de funcionários da agência também vem
sendo reduzido.
Emerson Duarte Monte, da coordenação do Grupo de Trabalho
de Ciência e Tecnologia (GTCT) do ANDES-SN, denuncia os cortes orçamentários.
Ele explica que, nos últimos anos, o CNPq e a Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior têm sofrido uma redução geral nas despesas
liquidadas. A Capes é vinculada ao Ministério da Educação.
“O maior volume de recursos executado neste período no CNPq
foi R$ 2,9 bilhões, em 2013. Em 2018, o valor foi de R$ 1,3 bilhão, portanto,
uma redução real de 56%. Já os recursos da Capes obtiveram o pico máximo no ano
de 2015, com o valor de R$ 9,1 bilhões. Em 2018, houve uma queda significativa
para R$ 3,4 bilhões, perfazendo uma redução real de 63%”, explicou o 2º
vice-presidente do ANDES-SN. Ele conta que o CNPq, em termos de volume
absoluto, teve perdas de R$ 1,6 bilhão no período de 2013 a 2018.
Corte
em C&T
A situação do CNPq tende a se agravar após o decreto 9.741,
publicado em 29 de março, em edição extra do Diário Oficial da União. O
contingenciamento de R$ 29,582 bilhões do Orçamento Federal de 2019 afetou a
Educação em R$ 5,839 bilhões. Já a Ciência, Tecnologia e Inovação foi afetada
em R$ 2,158 bilhões.
Em uma carta conjunta, as principais entidades científicas
e de ensino superior do país criticaram o anúncio do governo federal. Com o
congelamento de 42,2% das despesas de investimento, o MCTIC ficará com apenas
R$ 2,947 bilhões do total das despesas discricionárias.
A carta aponta que o Ministério já estava com um orçamento
extremamente reduzido em 2019, devido aos sucessivos cortes dos últimos anos.
“As novas restrições orçamentárias atingem a integridade do programa de bolsas,
fonte da formação de novos pesquisadores desde a criação do CNPq”, afirma. A
carta alerta que tamanho corte “inviabiliza o desenvolvimento científico e
tecnológico do País”.
“Queremos que todos os cidadãos, em especial as crianças e
os jovens, tenham garantidos seus direitos educacionais e sociais. Motivos
justos para comemorações intensas pelo conjunto dos brasileiros, nos próximos
anos e décadas, serão a superação do analfabetismo e da miséria, o avanço
significativo na educação, na ciência e na tecnologia, uma melhor qualidade de
vida para todos, a redução das desigualdades, a preservação do meio ambiente e
de nossas riquezas naturais, que estão em causa neste momento, e o
desenvolvimento sustentável do País”, afirma o manifesto.
Corte
de bolsas da UFU
O ataque aos orçamentos da Educação e Ciência e Tecnologias
públicas não se restringe à esfera federal. Um dos exemplos é o corte de quase
cinco mil bolsas da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) em
todo o estado mineiro. Uma das instituições afetadas é a Universidade Federal
de Uberlândia (UFU).
Em 29 de março, a UFU anunciou o cancelamento de 238 bolsas
de Iniciação Científica, por tempo indeterminado. Os investimentos na Fapemig
caíram de R$ 300,7 milhões, em 2018, para 6,7 milhões, em 2019, segundo
informações do G1. Desde 2016, a Fundação vem sofrendo com a irregularidade de
repasses. Nos últimos meses, a situação se agravou, culminando com a suspensão
do pagamento de bolsas. Pela constituição estadual, o governo deve repassar 1%
da arrecadação à Fapemig.
Revogar
a EC 95/16
Cristine Hirsch Monteiro, também da coordenação do GTCT,
critica o posicionamento do atual governo federal. Ela argumenta que ao optar
por não investir na ciência nacional e na educação superior, Bolsonaro
demonstra uma “visão subserviente".
“Na ausência de um programa concreto, a equipe do governo
Bolsonaro tem privilegiado a divulgação de dados manipulados sobre a
Previdência e a Seguridade Social”, afirma. Segundo diz, essa argumentação do
governo serve para “justificar o desvio de recursos públicos, que deveriam ser
aplicados para resolver questões sociais e mitigar os problemas que assolam o
nosso povo”.
Para a docente, não há como contar com investimentos do
setor privado para que as pesquisas no Brasil sejam viabilizadas. “Os
investimentos privados são localizados e retornam benefícios para grupos
específicos, na maioria das vezes grupos estrangeiros”, disse.
“O caminho que vem sendo trilhado pelo ANDES-SN gira em torno da revogação da EC 95/16, do Teto dos Gastos, e a revogação da Lei 13.243/16, Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação. Essas medidas têm reduzido os investimentos primários do governo e precarizado o trabalho de docentes e pesquisadores nas Universidades e Centros de Pesquisa públicos do país”, completou 2ª vice-presidente do Sindicato Nacional.