ADUFPEL - Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas

Logo e Menu de Navegação

Andes Sindicato Nacional
A- A+

Notícia

Docentes da UFPel desenvolvem projetos de cuidado em saúde mental

Desde 2015, o Brasil acolhe o movimento Setembro Amarelo, que tem como objetivo pautar e dar visibilidade ao suicídio. A campanha é iniciativa do Centro de Valorização da Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), já que no dia 10 de setembro é celebrado o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio. Desde então, a temática tem ganhado atenção e inserindo-se nos mais diversos espaços e segmentos da sociedade, que passou a ter um olhar mais atento ao assunto.  


Segundo números divulgados em setembro de 2018 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a cada 40 segundos uma pessoa se suicida no planeta, configurando-se como a segunda maior causa de morte entre pessoas de 15 a 29 anos de idade. De acordo com o organismo internacional, todos os países, sejam eles ricos ou pobres, registram casos de suicídio. No entanto, quase 80% desses óbitos são identificados em nações de renda baixa e média, segundo dados de 2016. A maioria das ocorrências acontece em zonas rurais e agrícolas. Ainda, segundo a OMS, o Brasil é apontado como o 8º país em incidência de suicídio no mundo, com mais de 11 mil registros anuais.


Suicídio entre jovens negros e população LGBTI+

A maioria dos casos acomete jovens negros. De acordo com o estudo publicado em cartilha divulgada pelo Ministério da Saúde sobre óbitos por suicídio entre adolescentes e jovens negros, de 2012 a 2016 a proporção de suicídios entre negros aumentou em comparação às demais raças/cores, subindo de 53,3% em 2012 para 55,4% em 2016. Além disso, o percentual de suicídios aumentou entre os pardos (2012: 46,2% e 2016: 49,3%) e indígenas (2012: 2,1% e 2016: 2,9%). Em 2016, a cada dez suicídios em adolescentes e jovens, seis ocorreram em negros. 


Os dados sobre o suicídio entre a população LGBTI+ também são alarmantes. Estudo produzido pelo The Trevor Project, maior organização do mundo relacionada à prevenção de suicídio LGBTI+, mostrou que jovens desta comunidade pensam três vezes mais em suicídio que cis heterossexuais e têm cinco vezes mais chances de colocar a ideia em prática. Além disso, eles correm maior risco de sofrer de ansiedade e depressão, de uso abusivo de substâncias ilícitas, fatores que podem contribuir para a tentativa de suicídio. 


Projetos na UFPel acolhem pessoas em sofrimento psíquico 

O suicídio pode ser evitado e por isso que a abertura de diálogo e a compreensão das razões que levam alguém a acabar com a própria vida são capazes de reverter esse quadro. Nesse sentido, as docentes do curso de Psicologia da UFPel, Miriam Alves e Marta Janelli, desenvolvem projetos que buscam não só qualificar a escuta clínica no processo de formação dos estudantes, mas também oferecer acolhimento psicológico para aqueles que passam por algum tipo de sofrimento.


Marta Janelli desenvolve o projeto de extensão de clínica ampliada para pessoas em crise e o projeto de ensino chamado de “Estudos de Morte e Luto”. Miriam Alves, que também é diretora da ADUFPel-SSind, coordenadora o projeto de extensão "Diz Aí”. Segundo as docentes, os projetos têm como foco olhar e fazer a escuta com essas pessoas sem negligenciar, como historicamente ocorreu não apenas na Psicologia como também no campo da saúde em geral. 


Janelli e Alves atentam que o sofrimento faz parte da vida, e as pessoas têm que aprender a lidar com esses sentimentos e aceitar que eles estarão presentes no dia a dia. E esse sofrimento pode variar de indivíduo para indivíduo e é singular. O que deve acontecer é saber lidar com ele de acordo com a forma na qual ele se apresenta. “O tipo de pessoa, de sofrimento ou de necessidade varia muito. Não existe o que é mais importante e o que é menos importante. A gente tem que ver o que na verdade a pessoa precisa”, explica Janelli. E o atendimento psicológico, por meio de um acolhimento, é fundamental para dominar esse sofrimento. 


Na UFPel, o curso de Psicologia oferece várias formas de atendimento à comunidade de Pelotas e região, como o Serviço Escola de Psicologia (SEP). O serviço é gratuito, via Sistema Único de Saúde (SUS), e proporciona não só um atendimento sistemático em forma de tratamento, mas um acolhimento. 


Projeto “Diz Aí”

Coordenado pela docente Miriam Alvez, o projeto “Diz Aí” é uma das modalidades oferecidas pelo SEP. A ideia do projeto, conforme explica a professora, é qualificar a escuta clínica no processo de formação para violências racista, sexista e LGBTI+fóbica, que produzem sofrimento psíquico. A partir desse recorte, são atendidos/as homens e mulheres negros/as e transgênero e demais pessoas vulnerabilizadas por diferentes violências, que são acolhidas/os e, se assim desejarem, acompanhados/as em psicoterapia individual ou grupal, ou ainda encaminhados/as para outros serviços da rede de atenção à saúde do SUS. O espaço de atendimento fica localizado no Centro de Pesquisas Epidemiológicas da UFPel (rua Mal. Deodoro, 1160). 


O “Diz Aí”, segundo Alves, vem para problematizar o racismo/sexismo e a heteronormatividade no campo da psicologia e da saúde mental, na perspectiva de qualificar a escuta clínica dos/as profissionais. “Atendemos pessoas cujo sofrimento foi produzido pela violência racista, sexista ou LGBTI+fóbica, ou ainda pela interseccionalidade dessas violências. (...) Nesse contexto, a população LGBTI+, por exemplo, vai vivenciar a violência no seio familiar sendo expulsos/as de casa, nas ruas, nos diferentes espaços sociais por onde circulam. Violências que marcam a constituição subjetiva dos sujeitos e que produzem sofrimento psíquico. Quanto à população negra, nós começamos a identificar e nomear a violência racista quando nos descobrimos negros e negras em uma sociedade racializada, onde ser humano é ser branco. Sociedade cuja branquitude não se percebe racializada e raça passa a ser sinônimo de negro. Não temos dúvidas sobre o quanto a supremacia branca, sobre o quanto o privilégio da branquitude produz a violência racista e dos efeitos disso na saúde mental da população negra. Não é atoa que o suicídio de jovens negros é maior do que em jovens brancos”, aponta.


São dois grupos terapêuticos, três turnos para acolhimento e horários para a psicoterapia individual realizados por quatro estagiárias, uma extensionista, três psicólogos/as, três professoras orientadoras, que estão empenhados/as com esses atendimentos. O projeto surgiu a partir de um estágio curricular, em 2016, e, a partir de propostas de algumas estagiárias, no primeiro semestre de 2017, foi realizado um piloto. Desde então, o projeto foi sendo qualificado e hoje está consolidado.


Projeto de clínica ampliada e “Estudos sobre Morte e Luto”

O projeto de extensão de clínica ampliada, de responsabilidade da docente Marta Janello, é mais recente e foi criado pela necessidade de um atendimento mais dinâmico e prolongado, já que o atendimento ao público costuma acontecer somente durante os dois semestres de estágio dos estudantes. O projeto veio, então, para ampliar o tempo de acolhimento à comunidade. 


Além do projeto de clínica ampliada, a docente também desenvolve o projeto de ensino chamado “Estudos de Morte e Luto”, que objetiva capacitar os alunos em um viés mais focado para estas questões. De acordo com Marta, ele não é um projeto imposto, ele existe para favorecer esses alunos que se identificam com a temática e o compromisso do projeto. É através da inserção do estudante na comunidade e da observação que ocorre a qualificação do estudante de psicologia. “É uma psicologia social e comunitária que a gente está tentando trazer para a formação dos alunos, porque antes tinha uma psicologia totalmente elitista, onde poucos tinham acesso”, explica.  


A docente ressalta que nós vivemos vários lutos, como uma simples mudança de endereço. São diversas as frustrações que nos remetem a este sentimento e que geram sofrimento. Além disso, o luto de um familiar de alguém que se suicidou, por exemplo, é um luto não elaborável, mas um sofrimento que acompanha a pessoa por muito tempo. Nesse sentido, o trabalho do psicólogo é autorizar a pessoa a viver com essa falta. “O que nós trabalhamos, na verdade, é não facilitar que essa pessoa agregue a este luto outros sofrimentos que impossibilitem ela de viver uma vida saudável, mesmo com essa falta. Mas que ela consiga produzir, ter lazer, estudar e conviver com a família, mesmo que falte essa pessoa querida, e que ela não se sinta culpada ou menos culpada. Não podemos apostar que existe uma cura total para o sofrimento das pessoas. Isso não é uma verdade”, afirma. 


Ela também salienta que a questão do suicídio não se dá por uma razão única e que não existe um alvo maior. São várias razões que levam as pessoas a tirarem suas vidas, e que existe uma invisibilidade por parte das famílias para encontrar um motivo. Porém, nem sempre se encontra uma resposta, pois ela é silenciada pelo próprio sujeito que encontrou no suicídio a solução para a vida dele.


Ainda, atenta para a importância tanto da sociedade quanto da universidade de pensar sobre o assunto para o fortalecimento e valorização das redes de escuta. “Não é só a escuta do psicólogo que vai poder ajudar alguém que está pensando no suicídio como uma solução. As pessoas com quem nós convivemos precisam de alguém que as ouça, que acolha esse sofrimento”. 


Retrocesso na política de saúde mental no Brasil

Janelli aponta que vivenciamos, no país, um grande retrocesso em relação ao cuidado e à prevenção e que o atual momento político e econômico do Brasil tem provocado o aumento do sofrimento na população. São diversos os fatores que provocam esse sentimento, de acordo com a psicóloga, e que são expostos durante as sessões de terapia: falta de emprego, de estabilidade e de perspectivas para a aposentadoria. “São coisas que tiram o sono, que provocam uma desestrutura dentro da própria família. Às vezes o pai e a mãe estão sem emprego. Sabemos que hoje em dia não tem mercado de trabalho. As ofertas são para poucos”, confidencia. 


O Brasil é visto ainda em grande desvantagem em relação à prevenção ao suicídio e somente em 2015 aderiu à campanha do Setembro Amarelo. No Brasil, 79% dos suicídios acometem pessoas de média e baixa renda, o que é visto como uma questão preocupante pela docente. Os homens têm mais sucesso no suicídio, configurando como a quarta causa de morte. Entre as mulheres, é a oitava causa. Já, mulheres violentadas sexualmente cometem o suicídio em maior proporção do que as que não sofreram violência. 


“Então, podemos dizer que a saúde mental se faz urgente e presente em emergência sempre que a pessoa manifestar que ela está sofrendo psiquicamente. Isso serve para mim, para ti, para todas as pessoas, porque todos nós podemos um dia passar por uma situação difícil. Todos nós devemos cuidar bastante do outro, seja aluno, colega, professor, servidor técnico, porque todos nós somos importantes e queremos que as pessoas vivam uma vida relativamente boa e feliz. Isso é muito significativo para o setembro amarelo: cuidar das pessoas com quem nos relacionamos”, conclui. 


Atividade sobre suicídio acontece nesta sexta-feira

As docentes convidam todos e todas para a atividade "Conversando sobre Suicídio” que acontece amanhã (27), no anfiteatro da Faculdade de Medicina (Famed), das 19h30 às 22h. A ação é promovida pelo grupo de ensino sobre Morte e Luto e a programação inclui: performance “Vida” com a bailarina Miriam Guimarães e alunos do Curso de Dança da UFPel; palestra com a psicóloga Luci Feijó sobre “Suicídio: prevenção, luto e posvenção. A importância da escuta qualificada”e relato de experiências do Sr. Ivon Naval/AUSSMPE (Associação dos Usuários de Serviços de Saúde Mental de Pelotas). Os participantes receberão certificado de 4 horas.


Assessoria ADUFPel 

* Com informações de Organização Mundial da Saúde, Ministério da Saúde e Carta Capital


Veja Também

  • relacionada

    ANDES-SN lança campanha de combate ao racismo nas universidades, IFs e Cefets

  • relacionada

    Conheça algumas das mulheres negras que se destacaram na luta pela igualdade racial e pelo...

  • relacionada

    Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia de Tereza de Benguela...

  • relacionada

    Comunicado Consulta Informal Reitoria UFPel (Gestão 2025-2028)

  • relacionada

    Lei garante licença para mães e pais concluírem graduação e pós

  • relacionada

    67º Conad começa na próxima sexta-feira (26)

Newsletter

Deixe seu e-mail e receba novidades.