MEC interfere na democracia interna das Ifes
Nota Técnica publicada em
dezembro ataca democracia interna das Ifes
O Ministério da Educação publicou uma nota
técnica interferindo na democracia interna das Instituições Federais de Ensino
Superior (Ifes) no processo de escolha de reitores.
Divulgada em 17 de dezembro, a Nota Técnica nº
400 substitui a 437, de 2011. Ao contrário da anterior, ela sinaliza que
processos de consulta à comunidade universitária que adotem votação paritária
entre docentes, técnicos administrativos e estudantes pode ser passível de
anulação. A Nota Técnica registra que consultas com “peso dos docentes
diferente de 70% será ilegal, e deve ser anulada, bem como todos os atos dela
decorrentes”.
Ainda em dezembro, a Assessoria Jurídica
Nacional (AJN) divulgou uma análise da nova normativa do MEC, comparando-a com
a anterior. Segundo a AJN, a publicação de 2011 não considerava
irregulares consultas informais à comunidade universitária, com votação
paritária entre docentes, técnicos administrativos e discentes.
De acordo
com a AJN, a mudança trazida pela Nota Técnica 400, de dezembro de 2018, “deixa explícita a necessidade de seguir as
orientações normativas presentes na legislação em vigor, modificando a redação
anterior”. A análise
da AJN reforça que, embora essa orientação já constasse na legislação, a nova
publicação “pode sinalizar uma pré-disposição governamental de que eventuais
processos de escolha que não sigam essas determinações possam ser passíveis de
anulação”. Confira aqui a nota
da AJN.
Atualmente, a lei 9.192/95 e o decreto 1916/96
estabelecem que, em caso de consulta prévia à comunidade acadêmica, o peso do
voto do corpo docente será de 70%. Os 30% restantes são divididos entre
técnicos administrativos e o corpo discente, em geral, com 15% para cada.
Desta consulta pública, sai uma lista tríplice,
com os três candidatos mais votados. Essa lista vai para o órgão colegiado,
instância máxima da universidade, que em geral, vota pelo primeiro nome. A
lista tríplice, com a votação no primeiro nome, vai para o MEC, que sanciona,
ou não, a decisão do órgão colegiado. Nos últimos anos, o ministério da
Educação tem respeitado as decisões da comunidade acadêmica, escolhendo como reitor
o primeiro colocado da lista.
Avaliação
Segundo Antonio Gonçalves, presidente do
ANDES-SN, apesar das limitações, a Nota Técnica de 2011 previa o respeito aos
processos democráticos internos conquistados por docentes, técnicos e
estudantes.
Para ele, a imposição do cumprimento da lei, sem
a flexibilização a partir da autonomia universitária, fere a democracia
interna. “Nós já temos críticas à lista tríplice e ao modelo de eleição
indireta que ocorre hoje nas instituições. Nós lutamos ao longo dos anos para
ampliar a democracia nas universidades. Essa nota vem para cercear o mínimo de
democracia que temos. O Sindicato defende a eleição direta dentro da
universidade com o voto paritário ou universal, conforme a autonomia de cada
instituição”, disse.
Ines
Na última semana, o ministro da Educação,
Ricardo Vélez Rodríguez, ignorou a decisão da comunidade acadêmica na escolha
do novo diretor-geral do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines). O
ministro indicou Paulo André Martins Bulhões, que ficou em segundo lugar na
eleição interna.
A Associação dos Servidores da Ines (Assines,
filiada ao Sinasefe) divulgou uma carta aberta na qual criticou a decisão de
Vélez Rodrígues. Cobrou, também, que seja "respeitado o resultado do
processo eleitoral realizado no instituto, em novembro de 2018, com ampla
participação da comunidade escolar". A Assines ressaltou ainda que todos
os candidatos assumiram o compromisso de que não tomariam posse caso não
vencessem a eleição interna.
É a primeira vez que o primeiro colocado na
eleição no Ines não é o nome escolhido pelo ministério da Educação. O regimento
do Ines determina que o diretor-geral do instituto, com mandato de quatro anos,
seja eleito por meio de lista tríplice.
Alerta
O presidente Jair Bolsonaro (PSL), ao longo dos
seus quatro anos de mandato, poderá escolher os reitores de 11 universidades
federais, segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições
Federais de Ensino Superior no Brasil (Andifes). Antes de ser eleito, no pleito
realizado em 2018, Bolsonaro e sua equipe já sinalizavam a
interferência direta na escolha dos reitores nas universidades federais.
A preocupação da categoria docente é que a nota
técnica seja uma abertura ainda maior para os ataques a autonomia
universitária. “A luta era para superar a lista tríplice e, agora, estamos
vivendo um retrocesso com a nota técnica do Temer, com a perspectiva de um
aprofundamento dos ataques com as intenções de Jair Bolsonaro para as
universidades”, disse o presidente do Sindicato Nacional. Para ele,
analisando declarações recentes, o novo governo sinaliza uma mudança que
poderia até ser a indicação direta para os cargos de reitores.
“A universidade é um polo de resistência. As IES
federais são campos de resistência. Sucessivos governos tentam controlar para
sufocar e monitorar a produção de conhecimento. Essa nova forma de escolha dos
dirigentes visa cercear os direitos de livre expressão, a democracia e a
autonomia das IES”, concluiu o presidente do ANDES-SN.
*Com informação da Folha Dirigida.
Imagem: Divulgação/MEC