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Medidas e falas de Bolsonaro atacam reparação e memória em relação à ditadura

Não é de hoje que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) demonstra apoio à ditadura empresarial-militar ou nega sua existência. Nesse ano, já ordenou que fosse celebrado o golpe de 1964 e, recentemente, em mais uma declaração desrespeitosa às vítimas, questionou o assassinato do pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pelo regime. Além disso, realizou um desmonte da Comissão Especial sobre de Mortos e Desaparecidos Políticos, trocando quatro dos seus sete membros por assessores do PSL e militares e questionou o trabalho da Comissão da Verdade.


“As falas de Bolsonaro sobre o período autoritário e sobre os crimes cometidos pelo aparato repressivo não são uma novidade. A novidade, é termos um Chefe de Estado que opta por fazer uso do cargo para negar fatos históricos, distorcê-los e, inclusive, inviabilizar a continuidade dos trabalhos que vinham sendo feitos até então”, avalia o professor do Departamento de Sociologia e Política e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPel, Carlos Artur Gallo. 


O docente, que é um pesquisador da área de memória, história, justiça e política, evidencia que os efeitos das medidas e declarações de Bolsonaro podem ter graves consequências. “O negacionismo e o revisionismo chancelados pelo Estado podem gerar efeitos devastadores em todos os avanços que haviam sido alcançados desde 1995. Além da manutenção da impunidade dos crimes da ditadura, corremos o risco de ver ser destruída a memória que vinha sendo constituída (com muita dificuldade) sobre o período, e, inclusive, ver a continuidade da reparação ser inviabilizada. Não posso falar em nome dos familiares de vítimas da ditadura, mas presumo que desde o final da ditadura eles nunca tenham sido tão duramente atacados”, afirma.



Um histórico de ataques

Bolsonaro, em abril, também decretou o fim do trabalho das equipes técnicas que identificavam as ossadas enterradas na vala do cemitério clandestino de Perus, no estado de São Paulo, onde o regime militar enterrou pelo menos 1.500 vítimas da ditadura. Na sessão que analisou o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, em 2016, ainda, fez uma homenagem ao coronel Carlos Alberto Ustra, responsável pela tortura de Rousseff e de outros presos políticos. 


O professor Carlos Gallo lembra que, também como deputado, Bolsonaro teve um histórico de ataque às políticas de memória que foram criadas no país. Agora presidente, as falas e medidas se tornam ainda mais graves. “Não é razoável que um presidente da República negligencie o trabalho que vem sendo feito por órgãos oficiais há décadas, negue aquilo que foi reconhecido pelo próprio Estado brasileiro como sendo real (no caso, as violações aos direitos humanos praticadas pela ditadura) e/ou relativize as responsabilidades de quem cometeu crimes durante a ditadura no país”, analisa. O docente também salienta que estudos demonstram que o avanço de políticas de memória são prejudicados em contextos onde a democracia está ausente ou enfraquecida. “As prioridades do atual Governo, no tocante ao tema, são bastante claras e sintomáticas”.


Histórico das políticas de memória no Brasil

As políticas de memória no país, de acordo com o professor, podem ser observadas a partir de dois momentos. O primeiro é ainda durante a ditadura, com a Lei 6.683/1979, conhecida como a Lei da Anistia. Esse primeira etapa, diz Gallo, é assinalada por uma retórica de reconciliação que traz como resultado impunidade e esquecimento. “[A Lei da Anistia] relegou os crimes da ditadura ao esquecimento, impondo a impunidade dos agentes da repressão como um item não-negociável da transição à democracia (transição esta que foi extremamente longa, durando aproximadamente 11 anos, desde 1974 até março de 1985)”, avalia.


Já o segundo momento tem como marco a Lei 9.140/1995, com a criação da Comissão da Anistia, a qual só começou a funcionar em 2002, e a instalação da Comissão Nacional da Verdade, em 2012. O professor destaca que essas políticas contribuíram “para lidar com o passado autoritário, romper o esquecimento, e, de algum modo, reparar as vítimas e seus familiares” e surgem de uma mobilização tanto de organizações de direitos humanos como dos familiares das vítimas. Apesar disso, em relação aos crimes, nunca foram aplicadas penas.“Se é verdade que o Estado brasileiro não avançou no tocante à punição dos crimes cometidos pela ditadura no país (contribuiu, neste sentido, a decisão do STF no julgamento da ADPF 153, reconhecendo como válida a interpretação dada à anistia desde 1979) e não foi capaz de abrir seus arquivos sobre o período, também é verdade, entretanto, que o resgate de memória sobre o período autoritário avançou bastante nas duas últimas décadas”, pontua. 


Um terceiro momento, no entanto, conforme avalia, pode estar em curso. Em 2016, o então presidente Michel Temer (MDB) exonerou membros da Comissão da Anistia que haviam sido fundamentais no trabalho do órgão. E, com o governo Bolsonaro, aprofunda-se a política de esvaziar órgãos e desmontar o trabalho pelo direito à memória e à justiça.


Perseguição avança

O professor também avalia que, embora comparar o contexto da ditadura com o atual seja complexo, pois existem circunstâncias internas e externas distintas, algumas semelhanças entre ambos os períodos existem e são, para ele, impactantes. “A facilidade com que regras são relativizadas em nome de um 'bem maior'. A falta de respeito pelas instituições universitárias e por pesquisadores/as, com o estímulo ao patrulhamento ideológico. A perseguição aos movimentos sociais. Tudo isto relativiza nossa percepção sobre a continuidade da democracia e do Estado de Direito”, frisa.


Como pesquisador da área, Gallo também analisa que não é um momento favorável para estudar o assunto, já que há um avanço de discursos e práticas autoritárias, seja pelo governo ou por setores da população que aderem ao que chama de “discurso anticientífico, negacionista, contrário aos direitos humanos e de apologia à violência”. Mas, finaliza: “por esta razão que, talvez, seja essencial continuar estudando-o”.


Assessoria ADUFPel

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